DO
COLORIDO AO PRETO-BRANCO: as viagens quiméricas de Cipriano Souza
O que primeiro nos chama a atenção
nas obras de Cipriano Souza é o colorido rico, forte, inebriante de cores
primarias, secundarias, terciarias, contrastando com pequenas-grandes ilhas pictóricas
de preto-branco, provocando, ressaltando as luzes, formas, imagens, volumes e
sua poética. Sua pintura nos revela/expõe sonhos, visões de um
realismo-fantástico onírico, tão caro ao universo das artes latino-americanas,
mas um universo pictórico regido ao modo de ser do brasileiro, do baiano, do
sertanejo, de Cipriano.
A figuração, as imagens
materializadas de metres Cipriano, são povoadas de seres disformes, de flora
exuberante, de fauna exótica, de cotidianos agrestes/rurais e citadinos/urbanos,
mas, e, sobretudo reveladora do eu-poético de um homem sertanejo-cosmopolitano.
Cipriano Souza vem do sertão da Bahia, do Arraial de São
Domingos (1970), por mais que tenha vivido em terras paulistanas, de leituras
mil, de frequentes visitas a museus, galerias e exposições, de frequentar
ateliers, de “antenado” a mundo, não só das artes, ele é sempre foi, é e será o
cabra-sertanejo-baiano, que carrega consigo suas tradições, histórias, crenças
e valores éticos/morais. Isto não significa que ele esteja preso ao passado,
mas sim, que tem raízes na sua Bahia, no seu sertão, no seu sertanejo, no seu
eu-poético ...
Suas telas são verdadeiros mosaicos
ficcionais-poéticos. São pequenos recorte-colagens pictóricos oníricos-líricos
que se ligam pela poética e não pela temática, compondo painéis de puro
realismo-fantástico. São viagens a terras vividas, sonhadas e imaginadas,
desejadas. São momentos, eventos, factos presenciados cenas que ficaram retidas
em suas memórias, retinas e materializadas em suas telas. Não podemos
classificar a pintura de Cipriano simplesmente de naïf, ingênua, primitiva, ela
traz elementos de técnicas mesmo que sem os rigores da academia, mas há uma
elaboradas, que flerta com o acadêmico, com as vanguardas norte-américas dos
anos 70/80, Basquiat, Keith Haring (vide seus seres e faunas em p&b), ou do
francês Dubuffet, mas há Miró em cores e figurações, como dos modernistas e
modernos brasileiros, seja nos geométricos de Volpi, Hélio Oiticica, Fayga
entre outros, (vide seus portais, janelas e casarios). É certo que ele não
copia mas sim amplia caminhos e veredas deixados pelos grandes mestres.
A técnica e seus procedimentos
artísticos pictóricos empregados por Cipriano Souza é quimérico, ilusionista,
pois induz, o apressado, ver um simples grafismo xilográfico nordestino, à la
cordel modernizado, pintado em tinta acrílico.
O artista não usa tinta a óleo, pois
tem presa no executar, no materializar seu eu-poético, a óleo demoraria seu
fazer (o tempo de secagem é muito maior) logos as interferências frenéticas
seriam impossíveis para esse turbilhão poético. As pinceladas poderem ser
rápidas, grossas, carregadas de tinta, de energia, de velocidade, de consertos,
de sobre-de-mão, mas como dissemos, elas têm que ser pinceladas que secam
rapidamente para melhor trabalhar suas composições e elementos pictóricos, mas
há também as pinceladas suaves, de puro rigor acadêmico, finas e delicadas. Que
evidenciam seu total manejo com os pinceis,
O desenho, forma, imagens se dão
pelas pinceladas, não há crayon, dos pinceis tintados portem os volumes,
formas, texturas, delineando imagens, luzes e cores, e até mesmo a temática.
As temáticas de seus painéis/telas
nos remetem aos ingênuos, aos naïfs, aos primitivistas, aos não-acadêmicos,
porem sua técnica e consequentemente sua fatura vai além dessas rotulações,
como dissemos a obra de Cipriano é uma cocha de retalhos, não de imagens, mas
de técnicas, de várias escolas e matizes pictóricas, que não teme em mesclar,
colar, juntar suas pequenas pinturas num grande painel.
Cipriano está em constante busca do
materializar seu eu-poético expondo sempre a alegria de viver livre e solto,
sem rótulos e verdades acabadas ...
Roberto Palazzi
Cores agem
cor agem
Cores e coração
Ação das cores
Cores agindo com coração
Coragem!
Coragem é um ato de sobrevivência, não ter medo do ridículo.
Saber recuar quando é necessário
Coragem é meter o dedo na viola
Começa na hora do choro, no nascimento.
Lidar com Deus e o Diabo
Coragem é natural como o medo
Fazer candieiro para vender na feira, ao invés de pedir esmola
Uma reunião no fim de tarde no chiqueiro de cabra, brigando no tapa.
O tatame natural do sertanejo é o estrume das cabras.
Planta no pó quem tem faro fino.
Sente o cheiro da chuva antes de chegar.
Sabedoria!
Carregar o saco nas costas e jogar no chão.
No sertão meu amigo Rai Vento de seu Chuva, trabalhador.
Veio pra capital em um caminhão .
Vender chuchu na feira
Pintou o rodapé
Limpou as calhas
E olhando para o céu lembrou do ribeirão.
E assim começou a pintar
Coragem!